terça-feira, 16 de maio de 2017

Velhice ou para Mario de Andrade


mais da metade
menos de mim eu sei
mais da metade da idade
do tempo que morrerei
mais da metade do tempo
e há tempos
procuro gostar de mim
aprender com os erros
despertar dos enganos
marcas da vida
rumos sem par
e o lar descoberto
correndo pra cuidar
singelas conquistas
pistas
do que em mim pôde se dar
caso a mim mesma o segredo
possa enfim revelar

mais, mais da metade
filho criado
medo insano sanado
ou pelo menos
posto ao lugar
lugar em que a vida
está a chamar

mais que a metade
quase o dobro
e a velhice começa a rondar
e os olhos percorrem as rugas
e o brilho vai pra outro lugar
e os entes me levam ao tombo
quando me escondo
eles vem desvelar
a frágil menina ainda teima 
e se põe a orar
pra um deus rarefeito
posto que em tudo e em todo o lugar
e na mulher dói no peito
a falta do que não pode dar

que passe o tempo de espera
que a espera não seja sem tempo
que venham as dores no corpo
já que as da alma não hão de sanar
podem sim servir de passagem
estreita, escura passa a iluminar
alargar
as ancas
os lances
quem sabe assim eu cresça
antes de morrer
ou ir pra outro lugar

e fica a pergunta que escuto
nos sonhos ou logo ao acordar
será mesmo que crescemos
ou sempre o mesmo
ou sempre a mesma
iremos ficar
carimbo materno, paterno 
é o que há
e a cada abandono
a nós mesmos buscamos ocultar
seja sorrindo
seja chorando
mais da metade
e eu aqui cada vez mais criança
me ponho a lançar
mão da sorte
e faço da escrita meu sagrado lugar

moniquefranco, 26 de outubro de 2013, querendo crescer

Nenhum comentário:

Postar um comentário