Crônicas ficam
na alma. Demoram a estacionar no papel em branco. Na tela, em branco. Escapam
dos dedos por meio dos poemas... Ah! Quantos poemas não seriam crônicas, doença
e cura da alma; um remédio, assim, repentino são os poemas e curam de imediato,
o que estava ali, posto em sintoma. No conjunto, ainda que disperso e sempre
caótico, o registro que agonia, agoniza. A escritura sempre é limite, da dor ou
da alegria, sempre é escape, sempre é re-vista, ponto de vista, fenômeno da
hermenêutica não mais centrada num só – sujeito da sujeição, mas como convite
da novela da vida. Escritores, escrituras, leitores – formam os universais.
Leitores das linguagens, imagéticas, sonoras, sensoriais. Linguagens. Os
universais se expandiram ao longo desses vinte e seis séculos de nossa cultura.
Trouxeram os outros, além de nós, em nós, nos tiraram da mesmice do eu em si e
nos desafiaram a ser no outro. Crescem os universais quando dis-postos em
liberdade. E aí nem precisamos do relativo. Ele ali está, posto em presença, em
cada um do todo. Dasein? Assim parece nessa manhã de Finados destinada a ouvir,
ler e escrever – ver, sentir. Enfim sós! Eu e você. A música tocou por acaso
Anthony Philipis, nem tão por acaso assim. E veio a faixa.... quase um Baraka,
o som da música, o gosto. Procurei no youtube.
Vou postar, pensei. Não tem. Como não tem? No youtube só tem o que já tem? Replicantes constantes à rede? Isso. E
nós que os esperávamos fora de nós! Robôs. Que nada. Mas é quando retorna o
poema, a crônica, o conto, a novela, o som da música, a pintura da alma e tudo
retorna e há que se respirar aliviado. Sim, a arte salva.
Mas o que está
em jogo quando a alma toca e materializa algo, pelo menos, forma, disponibiliza
objetos – figurações finais, dispositivos finais? O ser? Ou a verdade? Ou a
verdade do ser? O ser de cada coisa em
sua tensão compartilhada? O discurso sobre o ser que nada pode ser ou a
correção do discurso sobre o ser? Validado. Temos aí alguns bons séculos de
pensamento entre os originários, os sofistas e os platônicos. Quanta dúvida,
quanta certeza sobre o que se pode ou não dizer sobre isto ou aquilo. Bom, isto
não é um cachimbo - ensinou-nos
Foucault.
Passeio por ou
entre fragmentos... terão sido, de fato, enunciados? A natureza ama
esconder-se. Eu também! A essência e a aparência. O que Dante diria? E sua
Divina Comédia? Com Copérnico, começamos nossa espiral descendente? Ela nos
levou à cosmologia de acordo com a qual somos habitantes insignificantes de um
insignificante grão de poeira num Universo de galáxias giratórias. O grão de
areia da praia que vem em nós a cada mergulho e para sempre se instala por entre
os pelos. E os universais? Tudo discurso; nenhuma permanência. O poema revela,
revela tudo que há em mim. Preciso disso, desse som. Do som da solidão. Há
pouco tempo o esti(a)mado amigo escreveu... e
se a alma insistir em ficar?/faço dela um par e vamos dançar?/do vento vem a
música/do mar o salão/só falta acertar o passo/para nela não tropeçar/alma fica
do lado/não me deixa não/vem dançar comigo/a música da solidão.
Sim, a solidão.
Sem ela, o poema, o pensamento, as letras, não, não se dão as mãos. É como no
gozo, o momento certo, revela o ponto certo que faz ecoar o som, a sensação...
do amor. A solidão é isso. Abrir a possibilidade do dar as mãos. O gozo certo.
Os fragmentos
voltam então. Nada, nada pode ser compreendido! Que alívio! Radical - Gorgias! Radical - Poiéses, sem métrica! Niilista elevado aos céus! Tanto nos ensinou
sobre o não! Vamos dialogar tal qual fez Platão! Não, melhor não, a persuasão
não tem estatuto, não tem senão. Cabe procurar a medida. Onde estará a verdade?
Qual o lugar do logos depois que a phisis fora cindida. Como se dá o verbo?
O fazer? A ação? Ou será a correção?
Crônicas ficam
na alma. E se a alma insistir em ficar? ( continua)
#moniquefranco, 02 de novembro de 2012
Fotografia:"On the easel" by Alexei Antonov oil on canvas, 30×40.